The digital services act (DSA)

É já no dia 17 de Fevereiro de 2024, que passará a ser diretamente aplicável em todos os Estados Membros da União Europeia o Regulamento (UE) 2022/2065 de 19 de Outubro de 2022, relativo à criação de um mercado único para os serviços digitais.

A Comissão Europeia propôs a implementação do Digital Services Package, a 15 de Dezembro de 2020, numa tentativa de, por intermédio deste, lograr a criação de um espaço digital livre e seguro, tanto para as empresas como para os cidadãos, pautando-se pela premissa: what´s illegal offline should be illegal online.

O mencionado pacote legislativo europeu desdobrou-se em dois regulamentos complementares, o Regulamento (UE) 2022/2065 de 19 de Outubro de 2022, relativo à criação de um mercado único para os serviços digitais e que nos ocupa neste artigo, e o Regulamento (UE) 2022/1925 de 14 de Setembro de 2022 relativo à equidade dos mercados no sector digital.

Apelidado pela própria União Europeia de Digital Services Act (“DSA”), o Regulamento (UE) 2022/2065 tem como principal objetivo a criação de um ambiente online seguro, transparente e fiável, que permita a todos os cidadãos europeus o exercício fácil e intuitivo dos seus direitos.

Os principais riscos que se pretende acautelar são, entre outros:

  • A difusão de conteúdos, bens, serviços e atividades ilegais;
  • A dificuldade em rastrear os comerciantes nos mercados;
  • A circulação de desinformação, “fake news” e discursos de ódio/discriminação;
  • A complexidade dos “termos e condições de uso” das plataformas;
  • A publicidade direcionada;
  • O ciber-assédio e a ciber-violência; e
  • A falta de controlo na navegação de menores.

Importa, desde já, salientar que não é o DSA que define os conceitos acabados de mencionar, como por exemplo o que é ou não considerado “conteúdo ilegal” O grande carácter inovador deste Regulamento é precisamente de ter criado o mecanismo legal para considerar automaticamente aplicável on line, toda e qualquer norma já existente no direito da União Europeia ou na legislação nacional de cada pais membro.

Aqui chegados cumpre referir que o DSA é aplicável a todos os “(…) serviços intermediários oferecidos aos destinatários do serviço cujo local de estabelecimento seja na União ou que nela estejam localizados, independentemente de onde os prestadores desses serviços têm o seu local de estabelecimento”.

Deparamo-nos, assim, com mais um caráter fortemente inovador deste DSA, uma vez que é aplicável a serviços intermediários que não tenham sede na UE, mas orientem as suas atividades para o espaço da UE, mesmo que parcialmente. São considerados, entre outros, exemplos indiciários de que a atividade de um serviços intermediário é dedicado ao espaço da UE, a utilização de uma língua oficial de uma país da UE bem como  a utilização do € ou de outra moeda de um pais da UE como forma de pagamento.

Mas o que são, então, considerados serviços intermediários? Pelo prisma do DSA estes podem ser tipificados nas seguintes categorias:

  • Serviços de simples transporte (“mere conduit”): consiste na transmissão, através de uma rede de comunicações, de informações prestadas por um destinatário do serviço ou na concessão de acesso a uma rede de comunicações – como por exemplo, um ponto de acesso wireless;
  • Serviços de armazenagem temporária (“caching”): consiste na transmissão, através de uma rede de comunicações, de informações prestadas por um destinatário do serviço, que envolve a armazenagem automática, intermédia e temporária dessas informações efetuada apenas com o objetivo de tornar mais eficaz a transmissão posterior das informações a outros destinatários, a pedido destes;
  • Serviços de alojamento virtual (“hosting”): consiste na armazenagem de informações prestadas por um destinatário do serviço e a pedido do mesmo – como por exemplo as redes sociais e a cloud (nuvem).
  • plataformas em linha”: serviços de alojamento virtual que, a pedido de um destinatário do serviço, para além de armazenarem as informações, acabam por as difundir ao público.

Importa realçar que a página de internet de qualquer empresa permite, a mais das vezes, a colocação de comentários on line ou a avaliação de determinado produto, o que acaba por a fazer reverter ao conceito de plataformas em linha, sendo por isso obrigado ao cumprimento  deste DSA

A entrada em vigor do DSA deve ser observada por um duplo prisma:

Se o interessado for o destinatário dos serviços,  ou seja,  um mero utilizador, este passará a ter um maior controlo e poder de reação contra eventuais ameaças virtuais. O DSA gira em torno do reforço da proteção dos direitos fundamentais dos utilizadores, conferindo-lhes, por isso, uma posição privilegiada no ambiente virtual. Cumpre enumerar os mecanismos de reação reconhecidos aos “destinatários do serviço”:

  • A possibilidade de apresentar uma reclamação por infração praticada pelo prestador de serviços, junto do coordenador dos serviços digitais do seu Estado Membro, à luz do artigo 53º do DSA;
  • O direito a ser indemnizado por perdas ou danos à luz do disposto no artigo 54º do DSA, nos termos do direito da União e nacional de cada Estado Membro; e
  • A faculdade de resolução extrajudicial de litígios, por intermédio de organismos próprios de resolução extrajudicial de litígios certificados – cfr. Artigo 21º do DSA.

Já na ótica do prestador de serviços, será aconselhável diligenciar por um reforço acrescido no cumprimento do DSA, de modo a estar ciente e salvaguardado das novas obrigações a que estará vinculado a partir de 17 de fevereiro de 2024. Entre as demais obrigações especiais, salienta-se as obrigações de devida diligência que serão sempre aplicáveis a todos os prestadores de serviços intermediários online, independentemente da sua dimensão e categoria. São estas:

  • O cumprimento das decisões de atuação contra conteúdos ilegais (artigo 9ª DSA);
  • A prestação de informações específicas (artigo 10º DSA);
  • Criação de pontos de contacto específicos;
  • Designação de um representante legal);
  • Cumprir com os requisitos relativos aos “termos e condições” previstos no DSA;
  • Disponibilizar ao público relatórios anuais de transparência.

O DSA constitui, assim, um reforço dos direitos do utilizador, mas também um reforço das obrigações dos prestadores de serviços.  É, também e uma vez mais,  um passo inovador da UE, mesmo a nível mundial, que se tem demonstrado rápida na tentativa de legislar a “nova” realidade.